Mageia 8 Plasma: o carro e a pintura


Mageia é a herdeira da conhecida família Mandriva, cuja origem remonta a 1998. A história de Madriva acabou em 2012 mas já no ano anterior alguns programadores da empresa francesa tinham começado a trabalhar num projecto paralelo: eis Mageia. Entretanto Mandriva renasceu das cinzas, agora como Open Mandriva: mas os utilizadores tinham gostado do projecto paralelo que tornou-se o exponente máximo da família.

Tanto a original Mandriva quanto as actuais distros assentam num projecto original e independente baseado em Linux. Em particular, o objectivo de Mageia é forjar uma distribuição orientada para o utilizador e com uma interface bem integrada com o sistema base. É disponível com vários ambientes de trabalho, incluindo KDE, GNOME e Xfce, com arquitectura de 64 e 32 bits e rolling.

Aqui vamos analisar a versão Plasma (KDE) de 64 bits.

 

Instalação: 3

E começamos mal. Não que a instalação seja complicada, nada disso. Mas é inutilmente confusa. O instalador de Mageia (cujo nome é DrakX, nada menos) conduz através dum percurso atormentado, que dura 12 minutos, quando tudo poderia (e deveria) ser mais rápido e sintético.

Por exemplo:

Pensamos realmente que um novo utilizador Linux conheça grub2-graphic em /dev/sda e, eventualmente mudar a localização? E o que é suposto fazer com a interface automática? Estas são opções destinadas aos usuários avançados, que sabem como e quando aceder a elas.

Justo oferecer a instalação dos updates. Mas, além da gráfica que deixa muito a desejar, o que pensará o novo utilizador Linux acerca das "dependências"? "perl-5.32.1.1.1mga8.x86_64?"? Vamos instala-lo ou não?

O que diz DrakX? É preciso reiniciar o computador "para dbus" e os amiguinhos dele? Ok, reiniciamos...

Ehi, mas não tinha dito que era suposto reiniciar? O que é isso agora?

O aviso dantes. Reparem no rebordo da janela fantasma abaixo do Pronto... Mas desta vez funciona, vai mesmo reiniciar após o sistema ter ocupado 5.8 Giga de espaço em disco. Lembramos: OST é dedicado a quem nada sabe de Linux mas quer um sistema que funcione sem complicações dignas de nerds: então DrakX pode servir como modelo para aprender a como não fazer uma instalação.


Arranque: 5.0

11 segundos, não excepcional. Sobretudo porque aparece o logo de Mageia, depois desaparece, volta a aparecer, desaparece, o ecrã fica preto, aparece uma escrita ilegível, volta o logo e, finalmente, eis o desktop. Algo mais tranquilo, como uma imagem fixa?


Ambiente de Trabalho e Menus: 8.0

O desktop é bonito e o mesmo pode ser dito da organização dos menus. Não admira, é o ambiente de trabalho KDE Plasma, um dos melhores no universo Linux. E a propósito de menus: na barra de tarefas, no bordo inferior do ecrã, há o ícone da Configuração do Sistema (é o ícone preto do lado esquerdo na imagem acima), através do qual acede-se ao painel a partir do qual é possível gerir todo o sistema, com particular atenção ao aspecto gráfico. Finalmente todas as opções reunidas num único lugar!

Importante também porque KDE Plasma permite uma infinidade de ajustes, podendo tornar qualquer desktop único e verdadeiramente "nosso". Inclusive, toda a organização é muito superior ao análogo sistema Windows.

Apesar da disposição ser original, KDE Plasma recalca o esquema geral de Windows, pelo que não há dificuldades em encontrar a opção e os programas dos quais estamos à procura. Um desktop e uns menus muito bem conseguidos. E com isso ganha a funcionalidade também. Todavia...

Todavia, apesar do ponto de partida ser óptimo, Mageia parece não tirar o máximo partido dele. Há qualquer coisa de "velho" no meio de tudo isso: será o estilo dos ícones, será o tipo de fontes, mas a implementação de Mageia no ambiente Plasma está longe de alcançar o topo.

 

Programas: 8.0

Mageia está de parabéns neste aspecto: nada falta. E, aspecto importante também, o projecto importou um bom número de programas pensados pela equipa KDE, o que conjuga qualidade com uma óptima integração do ponto de vista gráfico também.

Acerca dos programas: há tudo, impossível listar tudo. Só alguns itens: há KolourPaint, uma espécie de Paint de Windows mas ainda mais funcional; há Kdenlive, um óptimo instrumento para editar vídeos; há o despertador, o personal organizer, Kleopatra (programa de criptografia), Akregator (um leitor e agregador de feed); há não um mas dois navegadores, Firefox (versão ESR) e Konqueror... até há um selector de emoticons. E sobretudo há KDE Connect, imprescindível num moderno sistema operativo para partilhar ficheiros com o nosso smaprthone.

Esta versão de Mageia vai muito além do básico: fornece todos os instrumentos para ter, desde o primeiro momento, tudo o necessário para explorar ao máximo o nosso computador, sem necessidade de procurar para novos aplicativos.

Se a coisa acabasse aqui seria uma maravilha. Mas há mais. No caso, para acrescentar programas, temos o Gerenciador de Programas. Que é simpático mas não o máximo. A apresentação dos programas não é imediata, tanto pela disposição dos itens quanto pela falta de imagens (que, na escolha dum programa, ajudam muito). Nada de grave, só que o Gerenciador faz lembrar o sistema Synaptic utilizado na família Debian: e isso assusta os recém chegados, não é um programa tão amigável. Verdade, programas é coisa que não falta. Mas tudo poderia ser melhor.


Personalização: 9.5

Se o desejo for personalizar, a escolha tem que ser KDE Plasma. As possibilidades são quase neuróticas e é possível passar horas ao experimentar as possíveis combinações de cores, fontes, sombras, estilos... Tudo de forma gráfica, obviamente. Óptimo.


Redes e conectividade: 9.5

Internet via cabo, wifi, bluetooth, smartphone: tudo reconhecido à primeira. Outra vez: óptimo.

 

Multimedia: 8.5

Desculpem o facto de repetir-me mas... óptimo. Ou quase. Temos um bom leitor de música (Clementine), VLC para vídeos, Kdenlive para editar os vídeos,  Spectacle para a captura de ecrã (pode ser facilmente expandido - o mesmo programa disponibiliza o download de alguns addson - para capturar vídeos do ecrã). Alem disso é possível instalar muitas aplicações a partir do repositório oficial de Mageia para ampliar as capacidades do nosso computador.

Nenhum problema me fase de reprodução vídeo com VLC nos vários formatos (mp4, WebM, etc.)

Como sempre: o que falta? Um gravador Cd/Dvd/Dados/Imagem ISO. Não faltam escolhas no repositório, mas incluir o válido K3b (o gravador de base para as distros KDE) no sistema de base não teria sido impossível.

 

Gestão Recursos: 4.5

Eis algo que "óptimo" não é. Para funcionar, Mageia gasta 857 Mega e o processador não pára quieto, mesmo quando não há actividade. Que fique claro: não são valores elevados em termos absolutos. São valores muito elevados porque os ambientes KDE Plasma costumam ser particularmente comedidos e eficientes neste aspecto. E estes maiores gastos não se traduzem numa maior reactividade do sistema, bem pelo contrário.

Há algo debaixo do capô que não está optimizado? Provável. Nada disso faz de Mageia um sistema "pesado", só que seria esperável ter outro tipo de prestações. Em qualquer caso, os requisitos mínimos para executar Mageia num computador são mais do que razoáveis:

  • Um qualquer processador AMD, Intel ou VIA;
  • Memória (RAM): mínimo de 512MB, 2GB recomendado (1 GB no caso do ambiente Xfce);
  • Armazenamento (HDD ou SSD): 5GB para uma instalação mínima, 20 GB para uma instalação ocasional;
  • Placa de Vídeo: qualquer placa de vídeo AMD/ATI, Intel, Matrox, Nvidia, SiS ou VIA;
  • Placa de Som: qualquer placa de som AC97, HDA ou Sound Blaster.

Pelo que, Mageia está apto para a maioria dos computadores em circulação.


Funcionalidade: 3.5

Eis um ponto tristonho. Até aqui vimos que o ambiente de trabalho KDE Plasma é deveras válido, um dos melhores da actualidade no universo Linux. Esquecendo um processo de instalação infeliz e uma prestações suficientes, o resto parece óptimo. Mas assim não é.

Como referido antes,"apesar do ponto de partida [...], Mageia parece não tirar o máximo partido dele. Há qualquer coisa de velho no meio de tudo isso". E não é apenas uma questão de estilos, de ícones, de fontes (coisas que afinal podem ser trocadas sem esforço): o problema é a forma como Mageia trabalha. Se tivesse que julgar só pelo que vi durante o teste, diria que esta é a primeira implementação do desktop Plasma no âmbito Mageia, algo feito com uma certa pressa até. Mas assim não é: Mageia utiliza o ambiente KDE Plasma desde 2017.

Apesar disso: a aplicação KNote (para apontamentos) demora 4 segundo para abrir-se e não se percebe qual a razão; no geral, todas as aplicações parecem reflectir meio segundo antes de abrirem-se. Funcionam? Sim, funciona tudo: só que a reactividade é outra coisa.

Nenhum destes pequenos atrasos torna Mageia "impossível" de usar, longe disso: é um sistema funcional e até poucos anos atrás teríamos definido Mageia como "reactivo". Mas o tempo passa e as coisas evoluem, também os sistemas operativos: hoje com o meu Linux Mint já não tenho o hábito de esperar, nem que seja meio segundo. E atenção, porque se 0.5 segundo não muda a nossa vida quando estamos na frente dum computador, é o sinal de que algo não bate bem.

Encontrei uma boa definição do problema no artigo de Jesse Smith (DistroWatch) dedicado à Mageia:

Não é que o Mageia esteja a piorar, mas não está a melhorar, não está a evoluir ou a corrigir bugs, e sente-se que não se tem mantido a par nos últimos dez anos à medida que outras distribuições movem-se para tornar as coisas mais fáceis e introduzir as funcionalidades que os utilizadores de desktop esperam nos dias de hoje.

É exactamente isso: Mageia está a ficar atrás.


Manual: 9.0

Voltamos ao "óptimo" pois temos aqui muitas boas notícias. Não há um verdadeiro manual embutido no sistema, mas quase.

Logo após a instalação, abre-se automaticamente uma janela (visível na imagem acima) chamada Bem-vindo à Mageia que ajuda na configuração básica do sistema e que sugere algumas páginas online de ajuda. Entre estas últimas em destaque:

...tudo em português! Esta sim que é uma comunidade.

Além disso, no sistema (com ícone residente na barra de tarefas) há o muito útil Cento de Controle Mageia (conhecido também como DrakConf) que ajuda a realizar as tarefas administrativas e de configuração (por exemplo, é aqui que é activado o firewall, pode actualizar-se o sistema, configurar a impressora, o scanner, uma rede VPN, etc.). Tudo outra vez em bom português. Parabéns.


Conclusões: 6.85

Não sei por qual razão, mas sempre tive um carinho especial para Mageia. Por isso esperava que a implementação do ambiente de trabalho KDE Plasma tivesse melhorado nesta versão 8 do sistema operativo. Mas assim não foi: debaixo da elegante camada fornecida pelo Plasma, há algo que não evoluiu. Além disso, há uma sensação de inacabado que reveste esta distro, uma falta de cuidados nos pormenores. Mageia complica quando tem tudo para simplificar.

Em termos gerais, Mageia não é um mau sistema operativo, longe disso. E faz algumas coisas verdadeiramente bem. Mas se olharmos com atenção, não é difícil entender que o "bom" é mérito do Plasma, o "mau" é de Mageia (com uma enorme excepção: o trabalho da comunidade, que é espectacular). Pelo que, Mageia 8 é como um carro velho com uma pintura nova. Então é preciso refrescar este sistema, e com uma certa pressa.

A pontuação final até não é mal. Mas faz sentido recomendar esta distro a pessoas que nunca utilizaram Linux? Diria que... "nim". Mageia funciona, nada a dizer. E, como lembrado, faz alguma coisas muito bem. Mas isso pode não ser suficiente: se esperamos um sistema operativo com os mesmos atributos dum Windows ou dum Apple, então Mageia não pode ser aconselhado. Se, vice-versa, estamos dispostos a fechar um olho acerca de algumas falhas (que não prejudicam o funcionamento do conjunto), valorizando mais o óptimo trabalho da comunidade, então é possível entrar no universo Linux com a distro francesa.

Mas é preciso lembrar que há distros baseadas no KDE Plasma bem melhores do que esta; e que se a ideia for iniciar com uma sistema operativo de tipo rolling, então é possível pensar num produto mais refinado, como Manjaro. 

 

Links para Mageia: Principal, Download